//CIDADE// Leis que ampliaram perímetro urbano de Serra Negra são inconstitucionais, diz MP



O procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo,  requereu ao Tribunal de Justiça (TJ) a abertura de uma ação direta de inconstitucionalidade contra duas leis que permitiram a ampliação do perímetro urbano de Serra Negra, promulgadas em 2021. Os dois projetos de lei, de autoria do Executivo, foram aprovados por unanimidade pela Câmara Municipal.

Segundo a petição encaminhada pela Procuradoria-Geral do Estado ao TJ, "a Lei nº 4.393, de 20 de abril de 2021, e a Lei nº 4.440, de 28 de setembro de 2021, contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31, da Constituição Federal, porque violam o disposto no Artigo 180, inciso II, da Constituição do Estado de São Paulo (que está alinhada com o disposto no Artigo 29, inciso XII, da Constituição Federal)."

Sarrubbo explica que o Artigo 180, inciso II, da Constituição Estadual, determina a participação da população em todas as matérias atinentes ao desenvolvimento urbano, como as relativas ao zoneamento, ao parcelamento, uso e ocupação do solo urbano, "sendo norma reiteradamente prestigiada pela jurisprudência". 

A democracia participativa decorrente desse artigo, continua o procurador-geral de Justiça, "alcança a elaboração da lei durante o trâmite de seu processo legislativo até o estágio final de sua produção, permitindo que a população participe da produção de normas que afetarão a estética urbana, a qualidade de vida, e os usos urbanísticos". 

Isso, porém, não correu no trâmite das duas leis contestadas pela Procuradoria-Geral do Estado. "Da análise do processo legislativo, constata-se que a aprovação do projeto de lei nº 37/2021 que originou a Lei nº 4.393, de 20 de abril de 2021, bem como do projeto de lei nº 90/2021, que originou a Lei nº 4.440, de 28 de setembro de 2021, não foi precedida por instrumentos de escuta popular, havendo vício de inconstitucionalidade por falta de audiências ou consultas públicas", relata a petição ao TJ estadual.

"Com efeito, o projeto de lei nº 37/2021, de autoria do chefe do Poder Executivo, foi apresentado no dia 07 de abril de 2021, tendo sido ofertado parecer pela Comissão de Justiça e Redação em 09 de abril de 2021, pela Comissão de Política Urbana, Meio Ambiente e de Cultura, Educação, Esporte e Turismo em 12 de abril de 2021 e pela Comissão de Finanças e Orçamento em 13 de abril de 2021. Já em 19 de abril de 2021 foi aprovado e no dia seguinte foi encaminhado o autógrafo para aprovação e sanção", informa o documento. 

"Já o projeto de lei nº 90/2021, de autoria do chefe do Poder Executivo, foi apresentado no dia 16 de setembro de 2021, tendo sido ofertado parecer em 21 de setembro de 2021 pela Comissão de Justiça e Redação, pela Comissão de Política Urbana, Meio Ambiente e de Cultura, Educação, Esporte e Turismo e pela Comissão de Finanças e Orçamento. Em 27 de setembro de 2021 se deu a aprovação do projeto e no dia seguinte restou encaminhado o autógrafo para aprovação e sanção", ressalta Sarrubbo, que conclui a sua argumentação afirmando que "seria imprescindível a participação da comunidade para discutir acerca da alteração do perímetro urbano, matéria essa de evidente reserva do plano diretor".

Falta de planejamento

O procurador-geral de Justiça levantou outro argumento em relação à inconstitucionalidade das duas leis. De acordo com ele, "os diplomas normativos questionados desrespeitaram a exigência de planejamento prévio, princípio que deve ser observado na edição de leis que veiculam normas relacionadas à instituição de diretrizes urbanas, afrontando os arts. 180, I e V, e 181, § 1º, da Constituição Estadual". 

Sarrubbo afirma que "o planejamento é indispensável à validade e legitimidade constitucional da legislação que veicula normas referentes à ocupação, parcelamento e uso do solo urbano e ao zoneamento urbano", ressaltando que, "contudo, decorre da análise do processo legislativo que deu origem à normativa questionada, a inexistência de qualquer discussão técnica, planejamento prévio e participação comunitária durante o seu processo legislativo". 

O procurador-geral explica que, "para que a norma urbanística tenha legitimidade e validade deve decorrer de um planejamento, que é um processo técnico instrumentalizado para transformar a realidade existente no sentido de objetivos previamente estabelecidos". Segundo ele, essa norma "não pode decorrer da simples vontade do , desprovida, em muitos casos, de elementos vinculados às reais necessidades do território e de sua população, mas de estudos técnicos que visem assegurar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (habitar, trabalhar, circular e recrear) e garantir o bem-estar de seus habitantes (art. 180, I, da Constituição Estadual)".

Nesse sentido, diz, "todo e qualquer regramento relativo ao uso e ocupação do solo, seja ele geral ou individualizado (autorização para construção em determinado imóvel e seus limites, regras sobre edificação, modificação da permeabilidade do solo, alteração do uso do solo para determinada via, área ou bairro etc), deve levar em consideração a cidade em sua dimensão integral, dentro de um sistema de ordenamento urbanístico, daí a exigência de planejamento e estudos técnicos".

Fracionamento do Plano Diretor

O último fator apontado pelo procurador-geral do Estado para justificar a ação direita de inconstitucionalidade contra as duas leis é que elas violaram o Artigo 180, inciso V, e art. 181, § 1º, da Constituição estadual, "pois a adoção de normas municipais alheadas ao plano diretor configura indevido fracionamento, permitindo soluções tópicas, isoladas e pontuais, desvinculadas do planejamento urbano integral, vulnerando sua compatibilidade com as diretrizes firmadas pelo plano diretor ou à integralidade de normas que nele deveriam constar." 





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